Uma Nova Fonte de Criação Pictórica
Rebolo Gonsales está expondo na 4 Planetas uma série de trabalhos de pequeno formato. Os quadrinhos obedecem a dias técnicas diferentes: alguns pintados à maneira tradicional do artista, são manchas feitas diante da própria paisagem, e que desta refletem a frescura e a espontaneidade; outros são de maior elaboração mental, e realizados mediante processo aparentado com o da gravura.
Aconteceu que um dia Marcelo Grassmann, que tem pela gravura furor missionário, convenceu Rebolo a experimentar a xilogravura. Arranjou-lhe a madeira, a tinta, os primeiros instrumentos, e Rebolo, deixando de lado seu pincel e a superfície escorregadia da tela, empunhou os instrumentos de corte e pôs-se a ferir as fibras vegetais. A experiência interessou-o, mas não o satisfez. Aquele simples sulco cortando a prancha e a oposição direta do branco e preto nas provas tiradas parecia-lhe um pobre resultado. Assim foi que começou a retocar as cópias com pinceladas e cor, e em pouco estava pintando diretamente sobre a madeira gravada.
Daí a voltar à pintura sobre tela foi um passo, mas ele aprendera, na gravura, a desbastar uma camada para revelar o interior da madeira, e foi quase naturalmente que começou a fazer a mesma coisa em sua nova pintura: ele pinta e depois tira, a intervalos, sulcos da camada pintada, que assim se torna irregular, farfalhante e misteriosa.
Admiradores de sua antiga maneira de pintar torceram o nariz diante do novo procedimento, achando que ele perdera a pureza. Mas o destino dos artistas é esse mesmo: são eles que criam a ótica mediante a qual o público aprende a ver seus trabalhos, e quando substituem o modo anterior por uma nova proposição, o público, aferrado à anterior posição, protesta. Com o tempo irá de novo alcançando aquilo que lhe parecera um salto dado pelo artista, e que na verdade foi o fruto de uma longa elaboração interior, afinal publicada. E quem não tiver a coragem de desprender-se, a intervalos, do círculo em que o público está habituado a situá-lo, não viverá a aventura artística. Rebolo, aos 60 anos, arrisca-se, e por isso continua criando.
Arnaldo Pedroso D'Horta
Jornal da Tarde, maio de 1967